A banalização da dor e a busca pela felicidade são os temas abordados pela Karma Cia. de Teatro


A sociedade contemporânea vive em eterna busca por felicidade e satisfação pessoal. Todos os dias há um bombeamento midiático de fórmulas mágicas para o alcance da felicidade integral, que reforça os padrões sociais impostos e que promete, por meio de produtos milagrosos, um cotidiano mais leve e prazeroso.

A dor é constantemente ocultada do convívio social, forçando o indivíduo a mostrar uma ideia mentirosa daquilo que vive, e essa é uma das principais questões abordadas no espetáculo “Em Respeito à Dor”, da Karma Cia. de Teatro. Nele, três personagens lidam com a responsabilidade de carregar seus pesos, questionando as circunstâncias, o divino, o tempo e o sentido da vida.

“A dramaturgia surgiu de maneira colaborativa entre os atores e diretor, de acordo com suas próprias experiências de vida. O fio condutor do espetáculo não é linear, tem várias voltas e vozes, é fragmentado e deixa o espectador preencher o que não está sendo dito, de acordo com sua vivência. As dores retratadas são universais, cada indivíduo em cena é um pouco de cada indivíduo da plateia, dessa forma a dramaturgia e consequentemente a encenação foram construídas de maneira a celebrar a dor e os fracassos junto com o público”, explica Mauro Filho, diretor do espetáculo.


Em 2015, o espetáculo fez temporada na cidade de Balneário Camboriú (SC), no Teatro Bruno Nitz, e foi selecionado para o 4º Festival Brasileiro de Teatro Toni Cunha (Itajaí/SC) e para 4º Festival Nacional de Teatro (Floriano/PI). A ficha técnica conta ainda com as atuações de Leandro Cardoso, Mauro Filho e Pietra Garcia, figurinos de Bryan Malkut, fotografia de Denis Natan e Thiago França como designer gráfico. 

sinopse
Dor: sentimento que surge em decorrência de dano causado a outrem ou a si mesmo; arrependimento, pesar, desilusões, pesos. Carregar, empurrar ou deixá-los para trás? Estamos condicionados a viver sem muito pensar, sem muito parar, sem muito respirar. Afinal, é preciso sempre estar alerta, atento, bem humorado, simpático, com um sorriso atraente e bem fisicamente. Quanto tempo sobra para viver a dor? Quanto tempo sobra para viver? Quanto tempo sobra?


por onde já passou

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Fotografia: Julian Cechinel

Fotografia: Denis Natan

Fotografia: Denis Natan









































































ficha técnica

Dramaturgia e Direção: Mauro Filho
Atuação: Leandro Cardoso, Mauro Filho e Pietra Garcia
Operação de som: Daniel Barros
Figurinos: Bryan Malkut
Design Gráfico: Thiago França
Fotografia: Julian Cechinel
Assessoria de Imprensa: Pietra Garcia
Cenografia e Produção: Karma Cia. de Teatro


o que já se falou

Atingiu o coração dos meridianos mais sensíveis. A peça soube desfilar pelos pontos nevrálgicos dos episódios recentes que abalaram o íntimo de cada espectador. Entrincheirados na tiraria do verniz social ou amparados na guaridas do Gestapo de Felicidade...Os atores são o reflexo do nilismo comportamental do qual somos catapultados hodiernamente. Com prática ou não..."Em Respeito à Dor” fustigou qualquer tentativa de fazer do sofrimento uma dor sumarizada. Tire seu sorriso do caminho que eu quero passar com a minha dor. 
Everton William, poeta

"Em Respeito à Dor, enfatiza, de maneira poética e sisuda, as intermináveis dualidades pertencentes ao ser humano contemporâneo, do mais íntimo do seu ser ao superficial cotidiano, trazendo à tona a dor como ponto de partida para a construção de uma série de pensamentos, interlocuções e sentimentos que ao longo da dramaturgia, vão construindo o arcabouço calejado e impregnado de tensões de cada um dos 3 personagens, que vivenciam seus próprios anseios, trancados e oprimidos na forma de uma espécie de peso que, para preservar a própria existência, eles necessitam empurrar compulsoriamente.
A fusão entre as técnicas do Teatro e da Dança Contemporânea deixam o espetáculo muito bem lapidado, deliberado, capaz de dilatar a pupila. Particularmente, eu gostei de cada movimento, de cada gesto, de cada palavra, de cada luz que se acendia e de cada paradigma que ascendia no decorrer de tão intensa peça. O figurino, bem peculiar, também retratava alguns aspectos do âmago dos protagonistas, mecanizados n'um cotidiano "cinzento" em que todos se enquadravam às regras e no qual Joãozinho, o indivíduo diferente em meio à multidão, não se enquadrava. Entre exercícios físicos, viagens, novas pessoas e suco de couve, ele se emancipou da categoria de mártir da própria solidão e impôs-se diante do próprio peso que se sentia coagido a carregar ininterruptamente dia após dia. Desejava piamente se encontrar... bom, e no final das contas, foram nós (a plateia) que nos encontramos em tamanho deleite teatral."
Taylla Vanessa, estudante


Hoje, o Festival Nacional de Teatro de Floriano apresentou "Em Respeito a Dor", do Karma Cia de Teatro (SC). O encontro de três corpos em processo de desilusão diante dos projetos do mundo pós-capitalista. A vida enquanto peso que não sustenta a alma. Um conjunto performático que nos leva a um série de referências que vão desde a sombria sonoridade de Peter Murphy à distopia totalizante contida na fúria de George Owell. Um grito contra a paranoia da meritocracia e da obsessão pela felicidade ruidosa, que persegue o homem de bem. "Em Respeito a Dor" é um exercício sobre nossos escombros, sobre nossos suicídios, sobre nossas doenças, o cinismo humano. Uma imersão profunda na dor invisível sentida no coração de Nadia, A professora maltratada por Marie NDiaye? O teatro dirigido por Mauro Filho é marcado pela futurologia da indiferença, do ódio, e do reconhecimento que somos mais pesados que nossos sonhos mais tolos. Um respeito aos estilhaços, que nos perseguem com o sorriso estampado, agora, amanhã e depois.
Aristides Oliveira, professor




críticas

Uma estética anódina para as sombras do sentir, por Luciana Romagnolli

À primeira vista, a cena armada pela Karma Cia. de Teatro, de Itajaí, no espetáculo “Em Respeito à Dor” remete às experiências que vêm sendo praticadas nos últimos três ou quatro anos no Núcleo de Dramaturgia do Sesi-PR, em Curitiba, sob a orientação do encenador Roberto Alvim. Espectros transumanos da fixa luz fria, do palco sob penumbra, do registro de atuação pouco emocional. Mas o território pelo qual trafega o diretor Mauro Filho é distinto, o da desumanização dos seres num contexto de elogio máximo à produtividade e à felicidade plena, este unicórnio pós-moderno.

Em outras palavras: dessubjetivação. Quem bem escreveu sobre o assunto foi o filósofo italiano Giorgio Agamben, para o qual os dispositivos atuantes no mundo contemporâneo ocasionam a dessubjetivação dos sujeitos. Dispositivos seriam “qualquer coisa que tenha de algum modo a capacidade de capturar, orientar, determinar, interceptar, modelar, controlar e assegurar os gestos, as condutas, as opiniões e os discursos dos seres viventes[1]”, ou seja, desde prisões às escolas, da filosofia à linguagem, da caneta ao computador, à televisão, ao smartphone. Eles produziriam sujeitos por um processo de assujeitamento, de modo que o dispositivo seria uma máquina de governo produtora de subjetivação. Na atual fase do capitalismo, porém, o processo já não corresponde a nenhuma subjetivação real. A ação dos dispositivos é de dessubjetivação.

Foto: Viviane Silva de Paoli

Este desvio filosófico traça o pano de fundo dos questionamentos existenciais contidos na dramaturgia colaborativa de “Em Respeito à Dor”. O experimento cênico sobrepõe camadas de verborragia e esforço físico para compor uma metáfora sobre o desgaste emocional e energético que é viver numa sociedade que condena – invisibiliza, expulsa, excomunga – qualquer manifestação de sofrimento (como o luto) por seu caráter improdutivo. Novamente cabe a referência ao estudo de Jonathan Crary[2], para quem o sono é o último reduto contra o capitalismo, por sua absoluta improdutividade – e, também por isso, o mais novo alvo.

O tratamento dramatúrgico textual dessa matéria faz-se por uma narrativa fissurada, reiterativa e não linear, cujos avanços e recuos operam por redundância, aproximando testemunhos de fracasso de Joãozinho (figura ficcional “desertora” da cruzada pela felicidade) a lições para o bem-viver, contidas em frases como “cuidei do meu corpo, esqueci de cuidar da minha alma” ou “me dei o direito de ser egoísta – recomendo”. As ações performáticas, como empurrar um bloco, debater-se, cair, inflar e soltar balões, contrastam a esse tom explicativo um diapasão mais sugestivo, em que a potência poética se sintetiza na forma de imagens simbólicas.

O peso do mundo – de si e do outro – já não é efeito de causas reconhecíveis;, descolou-se delas para tornar-se objeto concreto, dado a priori, que se manifesta no suor e no grito. As palavras sobram quando se tenta dar sentido à falta de sentido, mesmo como jogo de linguagem. Mas o paradoxo maior arquitetado na proposição cênica é a anodinia com a qual se problematiza o bloqueio da subjetividade e dos sentimentos humanos em sua diversidade de tonalidades. Pesa sobre a cena uma sobriedade estética expressa na frieza da luz sobre o espaço vazio, na uniformização dos figurinos e das ações, nas cores cinzentas, no automatismo dos corpos, na economia de expressões faciais, na sensibilidade maquínica. Eis a crueldade-moinho de um mundo sem sentido onde nem se pode sentir.

[1] Para saber mais sobre o assunto, ler “O que é um dispositivo?”, artigo de Giorgio Agamben disponível na internet e em livros como “O que é o Contemporâneo e outros ensaios”.

[2] Como citei em outro texto, o ensaísta trata desse tema no livro “24/7 Capitalismo Tardio ou os Fins do Sono”.

(Publicada originalmente em http://4festivaltonicunha.blogspot.com.br/)
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Luciana Romagnolli

Jornalista, crítica de teatro e produtora cultural. Graduada em Comunicação Social pela UFPR, especialista em Literatura Dramática e Teatro pela UTFPR e mestre em Artes – Teatro pela UFMG. Atuou como repórter de cultura nos jornais Gazeta do Povo (PR) e O Tempo (MG); e como crítica convidada em diversos festivais brasileiros. Ministra oficinas de crítica de teatro e é coordenadora de crítica do projeto Janela de Dramaturgia, em Belo Horizonte. Coordenou a produção do 15º Festival Internacional de Curtas de Belo Horizonte. É cofundadora e editora do blog Horizonte da Cena.

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Sísifos rebelados, por Valmir Santos

Um espectador levantou na segunda fila, deu as costas, pisou o corredor e rumou à saída quando a atriz Pietra Garcia defendia, por meio de uma das figuras do espetáculo Em respeito à dor, o direito de poder fazer tudo que lhe dá na telha, inclusive desistir...

Não se sabe se o homem desistiu. Ele pode ter se retirado por algum motivo e retornado à sala, fileiras atrás. O primeiro trabalho da Karma Cia. de Teatro, em dois anos de trajetória, indica pressupostos de um pensamento artístico provocador. Não há vez para o lugar-comum da ditadura do entretenimento, do conteúdo inofensivo, da subserviência ao aplauso.

O trio que está em cena expressa ambições mobilizadoras, sobretudo quando manifestadas por jovens dispostos a problematizar sua prática, seu pensamento, sua época e seu mundo para além das querelas provincianas ou tradicionalistas.

Pietra contracena com Leandro Cardoso e com o também dramaturgo e diretor Mauro Filho. De largada, os movimentos e as ações corporais reafirmam consciência de espacialização correlata à carga existencialista do texto e à sobriedade da encenação. Gestos, entonações e cores acinzentadas amparam os questionamentos e as crises do “eu” e do “outro”.

O liquidificador antimonotonia de assuntos permite desconfiança, até que a sensação se desfaz lá pelo primeiro quarto da apresentação e o projeto finca o pé para dizer a que veio. A autoajuda, o apelo publicitário, a receita de sucesso, o flagelo social, as variações de anestesiamento, a hipocrisia e toda uma agenda de indignação, íntima e cidadã, é colada às cenas manejadas pelo princípio da tríade que rege a montagem.

Três atores, três cubos em madeira inteiriça servindo ao espaço cenográfico e três totens de lâmpadas fluorescentes triangulando ao fundo e nas laterais do palco. A operação da luz fria é feita pelos atores. A simplicidade (ou seria rusticidade?) dos aparatos escondem o modo como eles são estrategicamente acionados e subsidiam as vozes que vagam na contramão das etiquetas e dos bons-costumes.

Foto: Viviane Silva de Paoli

O caráter manifesto da palavra falada ou escrita convive com instantes de silêncios e as demandas coreográficas. Apesar da potência da gestualidade em várias passagens – eficiente no alinhamento dos braços em punho, símbolo caro que poderia ironizar aquela loja de varejos que replica a Estátua da Liberdade –, ela chega a ficar a reboque do verbo – como na recorrência com que os corpos dão a ver o esforço de “empurrar” (e aqui a metáfora é vasta) apoiando-se nos cubos, elementar.

Mas a mesma imagem de seres a “empurrar” resume as inaptidões, o cansaço, ao mesmo tempo em que diz algo sobre a necessidade de resistir tal qual Sísifos sublevados. Uma juventude avessa à desesperança e que reage aos abscessos da sociedade. Sem essa de conformar-se com a inutilidade de rolar a pedra até o alto da montanha.

Os fragmentos de sensações e espasmos da obra deixam um rastro sobre certo Joãozinho, sujeito que é narrado por Pietra Garcia e aos poucos ganha feições. Suas pontuações dão um corpo e uma alma às pinceladas expressionistas de Em respeito à dor.

As três atuações ainda se ressentem de aspectos laboratoriais, uma rigidez possivelmente influenciada pelos temas que o espetáculo encara. Sente-se falta de distensão. Pietra Garcia denota trabalho de voz e olhar intenso, ela que dá corpo e alma a Joãozinho sem representá-lo.

Todos estão na esteira da não linearidade, com intenções lacunares para que o público preencha de acordo com seu repertório de vida e de contato com as artes cênicas. Sentidos livres.

Ainda é cedo, mas tudo leva a crer que a Karma não veio à luz por acaso no mês posterior às jornadas de junho de 2013, destinada a celebrar sua inconformidade pensando e praticando arte.

(Publicada originalmente em: http://4festivaltonicunha.blogspot.com.br/)
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Valmir Santos

Jornalista, crítico e pesquisador de teatro. Idealizador e editor do site Teatrojornal – Leituras de Cena. Escreve desde 1992 em publicações como Valor Econômico, Bravo!, Folha de S.Paulo e O Diário de Mogi. Acompanha festivais no Brasil e no exterior, tendo assinado curadorias ou consultorias para encontros em Recife, Belo Horizonte e São Paulo. Autor de livros ou capítulos com históricos de grupos. Mestre em artes cênicas pela USP.



Fotografia: Denis Natan

Fotografia: Denis Natan

Fotografia: Denis Natan

Fotografia: Denis Natan

Fotografia: Denis Natan


Fotografia: Denis Natan




























necessidades físicas

Palco Italiano - caixa preta com as seguintes dimensões mínimas:
09 metros de largura
07 metros de profundidade
04 metros de altura

Iluminação própria do grupo, que acompanha os materiais de cena.
Obs: Todo o equipamento de luz deve ter cabeamento para ser ligado na altura do piso.

Caixas com alta potência. Mesa de som com entrada para notebook.